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A maldição do samba-enredo na política

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02/03/2019 – 09h55

Três políticos que foram enredo no carnaval, mas acabaram presos, acusados de corrupção

A visibilidade proporcionada por holofotes e câmeras no sambódromo e o engajamento das comunidades representadas tornaram as escolas de samba um tentador palanque para políticos. Mas a história recente mostra que esse amor de carnaval não serve como habeas corpus quando o homenageado se complica com a lei. Um breve levantamento feito pelo Blog do Acervo mostra que pelo menos três políticos conhecidos que passaram por esse momento de glória tiveram um mesmo destino: cadeia.

A galeria foi aberta em 1994, por Anthony Garotinho, então com 34 anos. Àquela altura, já tinha sido prefeito de Campos e comandava a Secretaria Estadual de Agricultura do governo Leonel Brizola. Teve sua biografia contada pela Independentes de Cordovil, no Grupo A, com o enredo “O Garotinho de Campos vem aí…Sacudindo a Sapucaí”, meses antes de concorrer ao Palácio Guanabara, eleição que perderia no segundo turno para Marcello Alencar. Na apuração, a escola auri-anil acabou em um modesto 14º lugar entre 16 concorrentes e foi rebaixada.

No dia seguinte ao desfile, matéria do jornal O Globo “Política acaba em samba” trazia detalhes do desfile da escola da Cidade Alta, que enaltecia seus feitos políticos e a trajetória em emissoras de rádio AM:

“Cercado por amigos com bonés que lembravam sua campanha de pré-candidato, ele garantia que adora o samba: – Eu desfilo há dez anos. Sou carnavalesco mesmo. Aqui vale o sambista, não o político – disse, ao descer do carro alegórico, ao lado da mulher, Rosinha, grávida de cinco meses”. A então futura governadora gerava Clara, hoje com 24 anos.

Após o desfile, apesar da derrota para Alencar, a trajetória política de Garotinho seguiu ascendente: foi eleito governador do Rio de Janeiro em 1998 e deixou o mandato a meses do fim, para concorrer à presidência da república. Terminou a corrida ao Palácio do Planalto em terceiro lugar e elegeu a mulher, Rosinha Garotinho, governadora. Durante o mandato dela, o ex-governador assumiu o comando da secretaria estadual de Segurança Pública e, adiante, foi deputado federal. Já a Independentes de Cordovil, após despencar para a quarta divisão, enrolaria a bandeira três anos depois.

O enredo do carnavalesco Paulo Dez não tinha como prever o futuro: Garotinho acabaria preso duas vezes. Em novembro de 2016, foi detido preventivamente, no âmbito da Operação Chequinho, que investiga um esquema de compra de votos baseado na distribuição de recursos do programa Cheque Cidadão, em Campos.

Em setembro do ano seguinte, o ex-governador foi condenado a 9 anos e 10 meses de prisão, em primeira instância, pelo mesmo processo que o levou à cadeia no ano anterior. Ele foi preso quando apresentava um programa de rádio ao vivo, na Rádio Tupi. Na ocasião, a Justiça entendeu que o ex-governador continuava cometendo os crimes que levaram à prisão preventiva: coação de testemunhas e destruição de provas.

Em novembro daquele ano, ele e a ex-governadora Rosinha Garotinho foram presos, acusados de formação de uma organização criminosa para arrecadar fundos, de modo ilícito, para suas campanhas e de aliados. Nas três ocasiões em que foi preso, Garotinho negou as acusações e acabou solto por decisões de tribunais superiores.

CORAÇÃO CORINTIANO

O ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva sempre demonstrou publicamente sua paixão pelo futebol, com metáforas e analogias relacionadas ao esporte. Ele exaltava também sua relação com o Corinthians, clube para o qual torce. Em 2011, no auge da lua de mel do político com o clube, por ter fomentado a construção da Arena Corinthians, em Itaquera. Um estádio próprio era o sonho da torcida, e ele se tornaria palco da abertura da Copa do Mundo de 2014. Com isto, a Gaviões da Fiel decidiu homenagear seu torcedor ilustre contando sua biografia no desfile do Grupo Especial de São Paulo. Assim, levou para o sambódromo do Anhembi o enredo “Verás que um filho fiel não foge à luta. Lula, o retrato de uma nação”, contado com elementos de literatura de cordel.

Em fase final de recuperação de um câncer na laringe, Lula não compareceu, mas foi representado pela ex-primeira dama Marisa Letícia, que desfilou no último carro, ao lado do então presidente do Corinthians, Andrés Sanchez, que seria eleito deputado federal pelo PT dois anos depois. Na edição do dia 20 de fevereiro, O GLOBO contava, na matéria “Homenagem a Lula e um Herzog polêmico”:

“O carro em que estava a ex-primeira dama exibia o vídeo gravado por Lula. Após assistir o desfile pela TV, Lula telefonou para a mulher, emocionado”, explicava o texto. A escola da torcida organizada do Corinthians terminaria aquele carnaval em nono lugar, após uma controvertida apuração que terminou com envelopes de notas rasgados por um invasor, posteriormente absolvido pela justiça. Acabou atrás das rivais Dragões da Real, do São Paulo (8ª), e Mancha Verde, do Palmeiras (4ª).

O carnaval da Gaviões da Fiel contou, naquele ano, com uma doação, de valor não confirmado, da empreiteira Odebrecht. A empresa foi responsável pela construção do estádio corintiano.

Preso desde abril do ano passado, na Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba, o ex-presidente Lula tem duas condenações no âmbito da Operação Lava-Jato. Na primeira, foi condenado a 12 anos e um mês por corrupção e lavagem de dinheiro, no caso relativo à propriedade do tríplex do Guarujá-SP. Na outra, do sítio de Atibaia-SP, recebeu pena de 12 anos e 11 meses, pelos mesmos crimes. As duas condenações foram confirmadas em segunda instância dos processos, que transcorrem no âmbito da Operação Lava-Jato.

O CAMPEÃO DAS HOMENAGENS

Mesmo para padrões de políticos, a trajetória de homenagens a Francisco Manoel de Carvalho surpreende. Mais conhecido pelo eleitorado como Chiquinho da Mangueira, o deputado estadual do Rio, eleito para quatro mandatos, foi preso provisoriamente em novembro do ano passado, no âmbito da operação Furna da Onça, que investiga a participação de parlamentares em esquemas de corrupção no governo do estado. Bem antes de eclodir a investigação, o parlamentar foi enredo de duas escolas de samba. Na primeira vez, teve sua trajetória contada na Marquês de Sapucaí, pela Unidos de Villa Rica.

A amarelo e azul de Copacabana levou para a passarela do samba o enredo “Da Vila Olímpica à Villa Rica: um exemplo de vida”. Naquele ano, em um desfile em que a agremiação relegou suas cores ao segundo plano para destacar o verde e rosa da Mangueira, escola da qual o homenageado seria presidente anos mais tarde, a Villa Rica terminaria na quinta posição do Grupo A. Apenas as duas primeiras subiram.

Em matéria do dia 22 de fevereiro de 2001, o Globo-Zona Sul destacou o tema na matéria “Villa Rica narra a história de sucesso da Vila Olímpica da Estação Primeira”. O texto prosseguia: “O desfile da Unidos de Villa Rica será um mar verde e rosa no Sambódromo. A homenagem a Chiquinho da Mangueira, mentor dos projetos sociais da Estação Primeira, será também o reconhecimento do sucesso da Vila Olímpica da agremiação”.

O próprio homenageado falou sobre a escolha do enredo: “É um orgulho enorme para mim. Acho que sou o mais jovem homenageado por enredos de todos carnavais. Será emocionante ver a história da minha vida contada por uma escola como a Villa Rica na avenida”, disse.

Em 2010, desta vez, ano eleitoral, foi enredo na Mocidade Unida de Jacarepaguá, no grupo RJ-3, equivalente à quinta divisão. A azul e branco apresentou na Estrada Intendente Magalhães, no Campinho um tema bem parecido com o da Villa Rica: “Chiquinho da Mangueira – Da Villa Olímpica ao Maracanã, uma trajetória de esporte e cidadania”. Ficou em oitavo lugar e, dois anos depois, mudaria o nome para Mocidade Unida da Cidade de Deus.

Garotinho, Lula e Chiquinho da Mangueira: os três foram homenageados por escolas e samba, mas acabaram presos depois | Montagem/Editoria de Arte

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