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Temer aposta suas últimas fichas na intervenção do Rio

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16/02/2018 – 17h06

Ao mergulhar no buraco mais complexo da administração do Rio, presidente comprou o risco de sepultar o verniz administrativo de seu mandato

A dez meses e meio do fim de seu mandato, o presidente Michel Temer optou por apostar em um só lance todas as fichas que restavam em seu cacife. Os motivos que justificavam formalmente uma intervenção na segurança pública do Rio são muitos: a dramática insegurança fluminense, a apatia evidente do governador Luiz Fernando Pezão para continuar gerindo a crise que assola seu mandato desde o primeiro dia e a desconfiança criada entre os comandos militares e policiais durante as últimas ações em parceria no Rio, que levaram à saturação do modelo de Garantia de Lei e da Ordem que vinha sendo implementado nos últimos anos.

Se esses motivos explicam o enquadramento legal da decisão na terceira hipótese constitucional para que se realize uma intervenção – a necessidade de “pôr termo a grave comprometimento da ordem pública” -, eles são, no entanto, insuficientes para esclarecer decisão política de tal monta.

Desde que sepultou na Câmara a segunda denúncia apresentada pelo Ministério Público contra ele, o presidente Michel Temer tentava adiar o início de seu período como “pato manco” – aquele fim de mandato em que os governantes perdem a relevância para o debate eleitoral. A primeira boia de salvação buscada foi a da indispensável reforma da Previdência.

Apesar do esforço feito nos últimos meses, pouco ou nenhum avanço foi feito na conquista de votos para se atingir os 308 necessários para a aprovação da proposta do governo. Desde novembro, semana após semana, ministros palacianos alegam faltar “apenas” 40 ou 50 votos. O prazo final para votação chegaria na próxima semana – e até o mais ferrenho governista sabia que não haveria até lá os votos necessários.

Sem reforma da Previdência, sem qualquer perspectiva de discutir a tão falada reforma tributária, Temer estava às vésperas de se tornar coadjuvante no noticiário que tende a ser tragado pelas eleições. Súbito, decidiu então propor a intervenção no Rio de Janeiro.

Trata-se de uma jogada de enorme risco político e administrativo. Qualquer observador leigo percebe que a situação da insegurança pública do Rio não será resolvida rapidamente. O ex-secretário de Segurança José Mariano Beltrame precisou de anos para encontrar uma rota que parecia levar a uma melhoria na violência fluminense. Se Beltrame deixou o cargo reconhecido após quase dez anos de gestão, o general Braga Neto terá pouco mais de dez meses para estabelecer seu legado.

As leis da física impedem que a popularidade de Michel Temer desabe na hipótese de a intervenção ser um fracasso – e não é preciso que haja piora no quadro atual para que receba essa qualificação. Mas mesmo que não seja bem quisto pela maioria da população, Temer conseguiu cultivar em setores empresariais e em alguns nichos da sociedade a avaliação de que, a despeito das denúncias que o atingem, seu governo foi de fato responsável pela reorganização da economia, a recuperação da Petrobras e a aprovação de diversas medidas importantes no Congresso, como a reforma trabalhista.

Ao mergulhar de cabeça no buraco mais complexo da administração do Rio – o local onde mocinhos e bandidos trocam de papeis, ora integrando milícias, ora fazendo negociações com o tráfico – Temer comprou o risco de sepultar o verniz administrativo que lustrou ao longo dos 21 meses de seu mandato.

Só que há alguma lógica no risco assumido. O governo Temer tinha tudo para simbolicamente chegar ao fim com o provável arquivamento da reforma da Previdência nas próximas semanas. A intervenção dá início a uma nova gestão. E no momento em que o tema da segurança pública torna-se central para as eleições, Temer pode ganhar um ativo político que não tinha perspectiva de obter.

A posição de Jair Bolsonaro nas pesquisas presidenciais é hoje o maior símbolo dessa angústia coletiva em relação à segurança, mas seu radicalismo assusta a todos. Temer tenta com a intervenção tomar para si o comando da pauta de segurança pública. Os riscos de fracasso são enormes: militares não são treinados para lidar com criminalidade comum, muitos praças ainda hoje vivem em áreas dominadas por traficantes e milicianos que terão de combater e as polícias fluminenses não deixarão de ser permeáveis à corrupção do dia para a noite.

Mas e se a sensação de segurança melhorar significativamente? Em uma eleição na qual ter mais de 5% é sinal de prestígio, um presidente combativo na segurança pode deixar de ser um ativo tóxico para se converter em um aliado útil – ainda que seja muito difícil crer que em algum momento Michel Temer consiga índices mínimos de popularidade que viabilizem sua entrada na corrida pela reeleição.

Paulo Celso Pereira/O Globo

O presidente Temer e o governador Pezão

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